quarta-feira, 29 de junho de 2011

Simplória auto proclamação

O texto abaixo é de minha autoria, e foi publicado, na íntegra felizmente, mês passado no Boletim, extremamente institucional, da Universidade em que trabalho.
  Me deixou extremamente orgulhoso, me deu esperanças, e, em suma, foi um simplório debafo.
Segue a cópia:



A UNI(DI)VERSIDADE é possível?

*O Mensageiro
Há algumas semanas, o Supremo Tribunal Federal (STF), mais uma vez intervindo em questões teoricamente básicas à manutenção da República brasileira, constitucionalizou por unanimidade a união civil entre indivíduos do mesmo sexo. Sem dúvida, um ato que provocará grandes mudanças na sociedade brasileira e, naturalmente, na comunidade universitária, que nada mais é que um reflexo da sociedade civil, mesmo que muito raso.
Como deficiente físico e parte de uma minoria também constantemente escondida pela sociedade, me peguei pensando em como a Universidade irá encarar essa e outras mudanças. Pois, obviamente, virão outras após. Estaria a Universidade preparada para a diversidade que ela deveria, pelo menos no papel, abarcar? Sendo um reflexo, em teoria, mais “instruído” da sociedade civil brasileira, deveria abarcar a referida diversidade o mais imediatamente possível. Mas, infelizmente, assim como na sociedade brasileira dita “comum”, a Universidade ainda demorará bastante até conseguir aceitar de maneira unânime essas minorias.
Sou alguém que, quando anda pelo campus, tem de prestar extrema atenção para não tropeçar em calçadas com paralelepípedos altos e que, quando desce escadas campus afora, fica desesperado pela falta de corrimãos. Além de tudo, ouvi, certa vez, da então chefia imediata, que, sou “servidor cotista” e que a Instituição não está preparada para lidar com pessoas como eu. Analisando além da questão sexual das minorias e chegando às minorias em geral, e especificamente àquela em que me incluo, percebe-se claramente que a Universidade, por mais estranho que pareça, está anos-luz distante do que poderíamos chamar de “perfeição europeia” na acessibilidade a deficientes físicos.
E isso, no tocante a uma coisa que é aceita pela sociedade brasileira e mundial. Imaginem então quanto falta à universidade para alcançar alguma coisa próxima à perfeição europeia em atendimento a deficientes no que diz respeito à homoafetividade, que, em diversos lugares do mundo, ainda é vista como “sem-vergonhice”, “falta de pancada” e mesmo crime (Uganda discute a criminalização, não da homofobia como nós aqui, mas da homoafetividade).
Para ser um lugar de diversos, temos de ter um terreno adequado em todos os níveis – social, físico e também psicológico. É um exercício diário. Que muitos membros da comunidade brasileira e da universitária, infelizmente, esquecem – ou, na pior das hipóteses, não querem praticar
Atos homofóbicos como o ocorrido na recente calourada da Faculdade de Letras e a já esquecida agressão a um aluno da Escola de Belas-Artes em 2009 por um colega dele, e mesmo alguns ditos “pacíficos” trotes que sempre ocorrem a olhos vistos, inclusive pela comunidade externa, demonstram novamente o quanto a academia, centro do conhecimento e do saber, está longe de atingir a sua sonhada, ou não, diversidade. Ao mesmo tempo, vale a pena dizer aqui que a comunidade discente, pelo menos de forma aparente, demonstra bastante interesse em diversificar de maneira radical a Universidade, e isso é bom. Mas é preciso questionar se mais uma vez não estaríamos retroagindo, tendo em vista que, enquanto pensamos no que fazer com a diversidade dentro da Universidade, a sociedade brasileira e mundial continua andando a passos bem largos. Quando os discentes de hoje tornarem-se docentes, talvez essa discussão já seja parte de um passado negro que preferimos não lembrar.
É triste – e não é a primeira vez –, mas infelizmente a comunidade externa, por mais absurdo que possa parecer, está “pensando” mais uma vez muito mais rapidamente que a “Academia”. Isto é um grande paradoxo, afinal de contas não é a dita “comunidade externa” que deve incutir comportamentos na Universidade, mas o contrário.
Enquanto não formos capazes de lidar internamente com uma questão tão básica quanto a diversidade, não poderemos nos julgar tão dignos de transmitir conhecimento, pensamento ou qualquer outra forma de saber que geramos dentro do nosso lindo mundinho florido chamado Universidade.
É hora de pensarmos em políticas inclusivas muito além dos padrões. Muito além de cotas no concurso vestibular, a ideia de “além dos padrões” deve se estender ao exterior, ao campus como um todo, aos corpos docente, discente e técnico-administrativo, e se tornar não uma coisa “diferenciada”, mas normal. Um centro de excelência em ensino, pesquisa e extensão precisa se lembrar constantemente que também deve ser um lugar de diversos. Muito além de credos, cores, sexos ou mobilidades distintos.
Mas para ser um lugar de diversos, temos de ter um terreno adequado em todos os níveis – social, físico e também psicológico. É um exercício diário. Que muitos membros da comunidade brasileira e da universitária, que é um reflexo da primeira, infelizmente, esquecem – ou, na pior das hipóteses, não querem praticar.


*Continha-se o meu nome original ali, extraído por motivos óbvios...